sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Sêmem

Como o sêmen que inútil escorre pelos dígitos do onanista, eu escorro estéril pelas ladeiras desta cidade. Como um abutre em autofagia eu espero a morte para saciar minha fome de mim mesmo. Um dia tive asas, asas longas e brancas (feito um anjo, feito um demônio) e através delas estive em bares, lares e outros lugares. Eram asas imaginárias que ganhei no vapor barato da cânhamo, eram asas amparadas pela beleza da arte pura e ingênua. Eram asas que um dia me foram arrancadas e no lugar foi me imposta uma camisa de força, de castidade lúdica, para que nunca mais eu ousasse alçar vôo pelas janelas desta prisão.

E veio o vapor novamente, e rasguei a camisa de força, e minhas asas voltaram. Mas meu corpo já não suporta o esforço do vôo e canso-me logo após breve rasante por sobre mim mesmo. Minha mente anseia voar! Não o vôo treinado, conduzido; pré-estabelecido das noites de sextas-feiras, quero o vôo liberto e sem condicionamentos que me leva às estrelas e que por vezes me arrebenta nos muros da experiência. Quero sair deste corpo sem que o cordão de prata me obrigue a voltar, vou sair deste casulo abandonando este corpo, esta casa; esta vida.

Aos amigos a amizade, aos inimigos o meu melhor pote de fel; aos desconhecidos a minha ilustre insignificância.

Quase toda forma de amor morre para (talvez) renascer como uma fênix, quase todo amor escraviza, humilha e afoga a unidade do pequeno com o imenso. Se um dia pudesse voltar ao meu futuro que mudei no passado, eu teria um atelier ao invés de uma casa, um ninho ao invés de uma cama, um abraço ao invés de um olhar, um amor ao invés de uma companhia; um futuro ao invés de um passado.

Vejo o tempo passar levando meu irmão, meu pai, meus filhos, meus grandes e imensos amores, nacos da minha alma. Ô tempo! Eu que te meço, eu que te sirvo, eu que te odeio! Ô tempo! Se até o universo é assombrado pela tua frieza por que te medimos? Para mim o tempo passou como passa a paisagem pela janela de um trem em veloz movimento, mostrando a bela moça no caminho e que pelo mesmo caminho ficou, mostrando as crianças que ali mesmo ficaram, exibindo a vida que escolhi e desperdicei. Agora vejo o tempo passando e levando meu tempo que não tive tempo de medir, usar e mudar! Que venha o tempo final para mim e inicial para tantos. Saio deste marcador com a cabeça erguida de sempre, com a soberba dos que fizeram por merecer e por merecer a soberba sofrem pelo preço que ela impõe ao soberbo.

Saio desta vida como um ator que sai de cena, como um córrego que seca, como o ultimo acorde de uma musica, como o tudo que o todo não compreende.

Marcelo Silva
21 de abril de 2011
Ao pingo do meio-dia

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